Orgasmo – Novos caminhos do Prazer

Orgasmo – Novos caminhos do Prazer

publicado por Luciane Evans

Estado de MINAS

Estudos mostram que cerca de 40% das brasileiras não atingem o clímax, mas elas estão buscando novas formas de satisfação sexual, como a atividade física.

Para os franceses, “a pequena morte” (la petit mort). Para a medicina, a explosão dos hormônios. Na linguagem tântrica, um despertar. Aos homens, um mistério do sexo oposto. Para 40% das mulheres brasileiras um mito praticamente impossível de ser quebrado. Quem o encontrou, ainda que menos do que gostaria, sabe que não foi fácil e o caminho das pedras não é tão simples como anunciam tantas revistas e sites femininos. Em outras épocas ele foi palavra proibida, depois se tornou praticamente um dever e obrigação alcançá-lo.

O orgasmo, que sempre carrega consigo tantos mistérios, tem batido à porta de mulheres adultas, jovens e idosas por caminhos antes inimagináveis. É claro que, em se tratando desse assunto, nada é óbvio e muitos aspectos (mas muitos mesmo) são surpreendentes. Prova disso está no estudo da Universidade de Indiana (EUA), divulgado em março, que revelou que 124 mulheres, entre 18 e 63 anos, têm chegado ao orgasmo durante os exercícios físicos. Sim! Por mais incrível que possa parecer, aulas de spinning, escalada e até musculação têm permitido a muitas mulheres ter esse encontro inesperado. E não é só isso. Há quem tenha atingido o clímax por meio de massagens e de um controle da mente permitindo-se sentir o trabalho hormonal do próprio corpo.

O Bem Viver foi atrás dessas histórias, ouviu especialistas e mulheres que renasceram com a descoberta de que podem chegar ao orgasmo de várias formas. “Para alcançar esse momento é preciso quebrar muitos tabus, como os pudores e o sentimento de culpa. A busca é individual. Se estou prestando mais atenção em mim, me cuidando e estou bem comigo mesma, consigo me dar prazer”, defende a vice-presidente do comitê de sexologia da Associação Médica de Minas Gerais, a sexóloga e ginecologista Stany Rodrigues Campos de Paula.

É por aí mesmo. De acordo com a médica, as mulheres estão partindo para a maturidade de se descobrir e buscar seus direitos e próprios desejos. “Antigamente, a esposa não podia gozar, era considerada prostituta. Depois, com o tempo, ter orgasmo passou a ser uma obrigação. Aquela que não o atingia não era mulher. Aí, vieram as mentiras”, destaca Stany.

De acordo com o sexólogo Gerson Lopes, chefe do setor de medicina sexual do Hospital Mater Dei, com as mudanças veio, então, a ditadura orgástica. “A preocupação passou a ser pela performance. É o sexo mercadológico, em que você avalia, pesa e compara”, diz, acrescentando que, por isso, esse encontro tão esperado tem que ser visto como um direito que a mulher tem e do qual não pode abrir mão. “Mas é preciso cautela para que isso não se torne um dever”, alerta.

Pessoal e intransferível

Cada mulher sente o orgasmo à sua maneira. Por meio do autoconhecimento, muitas delas estão descobrindo novas sensações e a chance de serem mais felizes.

Não há uma receita, tampouco um caminho único que sirva para todas as mulheres. Nem especialistas em sexualidade nem psicólogos, muito menos ginecologistas descobriram a fórmula para essa busca. O orgasmo é pessoal e intransferível. E variável. Há aquelas que só conseguem chegar à satisfação sexual durante a relação e na troca de carícias com o parceiro. Outras não. A prova de que o assunto é misterioso e ainda dá muito pano para manga está nas descobertas femininas, que apontam, segundo sexólogos, uma nova era para a mulher: a de sua libertação, voltada ao poder de alcançar seu desejo sem ter a ansiedade pela performance perfeita.

Quem diria, por exemplo, que durante um exercício físico seria possível ter esse encontro? Foi o que mostrou um estudo inédito da Universidade de Indiana (EUA), divulgado em março. Os pesquisadores Debby Herbenick e Dennis Fortenberry entrevistaram 124 mulheres que relataram ter experimentado orgasmos induzidos por exercícios e outras 246 que tiveram prazer sexual também induzido por atividade física.

Com idade entre 18 e 63 anos, elas contaram que o clímax ocorreu enquanto faziam exercícios como spinning, abdominais e escaladas. O fenômeno foi chamado pelos estudiosos de coregasm. Os resultados, publicados na revista Sexual and Relationship Therapy, apontaram que mais de 40% das entrevistadas passaram por isso em mais de 10 ocasiões. A maioria disse ainda que, durante a experiência, não estava fantasiando sexualmente nem pensando em alguém por quem se sentissem atraídas.

Mistério? Para os pesquisadores, os dados são interessantes porque sugerem que o orgasmo não é necessariamente um evento sexual. “A pesquisa pode nos ensinar mais sobre os processos corporais subjacentes às experiências femininas”, concluiu Debby Herbenick. A atividade que mais contribuiu para o fenômeno foram os exercícios abdominais (51,4%). Depois estão o levantamento de peso (26,5%), ioga (20%), ciclismo (15,8%), corrida (13,2%) e, por último, a caminhada (9,6%).

A análise não causa espanto para Carmita Abdo, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e coordenadora do programa de estudos em sexualidade da USP. De acordo com ela, as atividades físicas liberam endorfina (hormônio do prazer) e, além disso, dependendo do movimento que se faça, há a estimulação do clitóris. “É lógico que para a mulher chegar a ter um orgasmo nessas condições é preciso que ela esteja saudável e predisposta a isso. Não é só chegar e entrar numa academia. A pessoa tem que estar bem consigo mesma, sem pressões nem de controles morais”, aponta.

É o que diz também a sexóloga Stany Rodrigues Campos de Paula. “Sabemos que, a partir de determinada frequência cardíaca, há a liberação de hormônios, como a endorfina e a serotonina. Nos exercícios há várias repetições de séries e, muitas vezes, a contração do clitóris”, diz. A médica, que é maratonista, revela que durante uma corrida já teve a sensação de prazer intenso. “Não queria parar de correr”, recorda.

Onda de calor

É o que já ocorreu com a relações-públicas C. G., de 27 anos, que prefere não se identificar. Durante uma aula rotineira de academia, quando fazia abdominal, sentiu o coração se acelerar, a respiração ficou mais profunda e uma onda de calor invadiu seu corpo. Os músculos vibraram e uma descarga repentina de energia a fez parar os exercícios. “Nunca imaginei que teria um orgasmo durante uma atividade física. A sensação foi tão intensa que fiquei com vergonha de alguém da sala de musculação ter visto. Sentei, bebi água e respirei fundo. Foi incrível”, lembra, dizendo que na hora não pensava em sexo nem em alguém que lhe interessasse.

Também com receio de mostrar o rosto e o nome, Maria (nome fictício) teve esse encontro orgástico, mas durante uma aula de spinning. Ela diz que, na época, estava interessada em um aluno da modalidade. “Sempre que o via sentia atração. Algumas vezes, durante as aulas, olhava para ele e vi que estava me olhando. O contato com a cadeira da bicicleta me fez sentir prazer à medida que os exercícios se intensificavam. Dava o gás na pedalada e, sem ninguém perceber, sentia ali uma sensação orgástica maravilhosa”, conta. Na opinião da fisioterapeuta e professora da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais e da equipe de uroginecologia do Hospital Mater Dei Elza Baracho, a experiência vai muito além. “Os exercícios podem ativar a musculatura pélvica. Mas a mulher que está alcançando isso certamente está bem com o próprio corpo.”

Evolução espiritual

"No relacionamento temos a preocupação de dar prazer ao outro, mas na massagem você sai do controle", Juçara Costta, artista plástica e atriz

Sem pressa, nem ansiedade e com foco na sensação. É por esse outro caminho, separando mente do corpo, que muitas mulheres têm alcançado o orgasmo por meio de massagens, buscando uma evolução espiritual a partir do prazer. É no Centro Metamorfose, instalado este ano em Belo Horizonte, que esse encontro tem sido feito com centenas de mulheres e homens, por meio da prática tântrica. “As pessoas ainda funcionam no primitivo. O prazer precisa ser um refinamento sensorial”, comenta Deva Nishok, criador do método e coordenador do centro, que tem unidades em todo o Brasil, com matriz em São Paulo.

Discípulo do mestre indiano Osho, Nishok diz que a realização vem com foco nas sensações e a movimentação da energia de base – a sexual. A massagem tântrica ativa os chacras de forma sensorial e movimenta a energia de maneira sensitiva, ativando centros localizados nos pés, nas mãos e nos genitais. “Em contato com esses valores, naturalmente o comportamento muda. A pessoa se torna mais disposta, otimista, recupera a autoestima e o amor-próprio, tem ânsia de viver intensamente. Ela então está feliz, aceita, coopera, compartilha, se abre”, defende.

Foi em 1996 que Deva criou o método. “Quando a pessoa é estimulada, ela combina uma sequência hormonal e, em algum momento, tem a descarga muscular, chamada de orgasmo. No grego, isso significa humores do corpo”, diz, acrescentando que a prática sexual não é suficiente para a produção intensa hormonal. “O pensamento e as fantasias criam um tipo de orgasmo falso, porque a pessoa passa a depender daquilo para chegar ao clímax. Por isso, o que provocamos é a capacidade do próprio corpo de produzir prazer. Isso não está na mente. É simplesmente corporal”, explica.

Os 50 terapeutas que atuam em todo o país são orientados a sair da intenção sexual. O procedimento é terapêutico. “Nosso trabalho é a expansão da consciência. O corpo produz muitos componentes que estão relacionados à sua sensação de prazer e bem-estar, que muitas vezes oscilam. O método procura regular esses hormônios, trabalhando com os toques entre as cadeias musculares”, conta o psicólogo Evandro Palma, terapeuta tântrico e responsável pelo Centro Metamorfose em BH. Ele afirma que na capital a procura pela prática tem aumentado entre as mulheres, que ainda representam 40% dos clientes. “Há aquelas que querem experimentar uma sensação nova e outras que nunca sentiram um orgasmo”, define.

Ele diz que há mulheres que, com as massagens, chegam a um êxtase que dura minutos ou até horas. “O orgasmo ainda está muito associado ao sexo. Então, quando a pessoa se relaciona sexualmente o ato em si está impregnado de significados. Se ela trafegar pelo caminho estabelecido, vai ter aquilo que sempre teve. Nossa intenção é neutralizar esses mecanismos”, diz, acrescentando que muitas vezes optamos em dividir o prazer com quem queremos ou amamos. “Mas ninguém é responsável pelo nosso prazer. Muitas vezes as mulheres ficam dependentes de seu parceiro para chegar lá”, critica.

Despertar

A artista plástica e atriz Juçara Costta, de 60 anos, conheceu o Centro Metamorfose em São Paulo e gostou tanto que ajudou o grupo a vir para BH. Hoje o centro funciona no andar superior ao seu ateliê. Ao mergulhar na prática, ela conta que seu primeiro passo foi tirar do corpo as crenças e mitos. “A gente fica no psicológico e ele vai fechando os canais de prazer. Fiz uma limpeza do corpo”, conta. Assim, ela descobriu que seu corpo estava adormecido. “Estava presa às repressões. Sou uma mulher de 60 anos e vivi muita repressão sexual. Havia uma culpa de permitir esse prazer”, conta. Com as massagens, Juçara diz ter sentido êxtase e plenitude. “Meu corpo despertou. No relacionamento temos a preocupação de dar prazer ao outro, mas na massagem você sai do controle. Anula a mente, passa a prestar atenção na respiração e em viver o agora. Foi quase um presente”, diz. Com a experiência, ela diz que seu prazer com a vida é muito maior. “Se não ocorrer o sexo, não tem importância. Estou vivendo minha sexualidade”, comemora. 




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